Artigos

QUALIDADE DE VIDA E CONTEMPORANEIDADE.

Compartilhar no facebook
Compartilhar no twitter
Compartilhar no email
Compartilhar no whatsapp
Compartilhar no linkedin
Compartilhar no telegram
Compartilhar no print

Como você está? Como tem vivido sua vida? Consegue dizer algo sobre seus anseios ou satisfação consigo mesmo? O quanto você tem conseguido acessar sensações de prazer, felicidade ou realização com a vida que tem hoje, e não apenas com aquilo que poderá conquistar no futuro? Você é feliz com a vida que leva?

Se eventualmente você se faz esses questionamentos, é algo bastante positivo e talvez já tenha dado o primeiro passo para refletir sobre sua qualidade de vida. Essas questões têm uma relação direta com o que denominamos – saúde mental. O que pensamos, como pensamos, a maneira como lidamos com as nossas emoções, expressam muito sobre a saúde da mente. Saiba que, qualidade de vida e saúde mental são inseparáveis e que, nossos afetos e pensamentos são suscetíveis a adoecer tanto quanto o coração, a garganta, o estômago, ou qualquer outra parte física do corpo.

Parece incrível que com a globalização, o acesso quase que em tempo real de uma infinidade de informações e pesquisas, mesmo assim, um número expressivo de pessoas ainda tem dificuldade de reconhecer determinadas doenças e ampliar o conceito de saúde. Por julgamentos preconceituosos, pessoas não querem ser reconhecidas como portadoras de transtornos mentais, pois, entendem o risco de serem vistas como fracas, desequilibradas, descontroladas ou incapazes, algo que alcança dimensões éticas do conviver entre humanos. Contudo, convém lembrar que ter saúde não significa necessariamente não ter nenhuma doença ou transtorno.

É importante mencionar que ao falarmos de doença, nos referimos a um padrão de sintomas com causas e medidas terapêuticas específicas. Da mesma forma, ao falarmos de transtornos, nos referimos a conceitos diagnósticos mais amplos, que apresentam trajetórias variáveis em cada indivíduo, são multifatoriais e, sendo assim, com demanda diversificada de formas de tratamento.

Sem dúvida, uma maneira preconceituosa de pensar a doença mental refere-se a relacioná-las àquelas apresentações estereotipadas de pacientes em internações psiquiátricas. Atualmente já temos conhecimento suficiente disponível para entender que todo desequilíbrio emocional é potencialmente capaz de facilitar o surgimento de transtornos e doenças mentais. Ocorre que, muitos de nós, apesar de adoecidos e em sofrimento nos mantemos funcionais e levando a vida. O excesso de positividade é saturante e violento, uma violência sistêmica que, segundo o filósofo Byung-Chul Han[1],  produz infartos psíquicos.

Manter a saúde mental nos dias de hoje, está longe de ser uma tarefa simples. Somos diariamente engolidos por um modus operandi que preconiza o desempenho e a produção. Multitarefas, hiper conexões, nos tornamos seres multimídia que vivem em uma sociedade focada no desempenho com imperativos de projeto, iniciativa e motivação. Exigências que assumiram um lugar dentro de cada um de nós se expressando como uma auto exploração de nossa força de trabalho, nossa energia mental, nossa disposição e, especialmente, de nossos desejos.

Apesar de que cada época possui suas enfermidades, as consequências físicas ou psicológicas são individuais e subjetivas. Exemplos como depressão, crises de ansiedade, déficit de atenção ou síndrome de burnout, são alguns dos resultados do modo como conduzimos nossas vidas. O excesso de igual, a massificação da positividade, a auto exigência de desempenho, tornaram-se aspectos naturalizados e, portanto, já não nos causam estranheza. Como bem diz Byung-Chul Han, por exemplo, a “síndrome de burnout é uma queima do eu por superaquecimento”. Então, estamos nos tornando máquinas? Fazer, realizar, conquistar, desempenhar, agir, praticar… verbos para uma vida conduzida pela hiperatividade que, quando não acompanha esse ritmo, nos retribui com a sensação de fracasso, incompetência e depressão.

A capacidade de bem-estar está relacionada a habilidade para manejar adversidades e conflitos; depende da condição para o reconhecimento e respeito dos próprios limites; é resultado da forma como a pessoa reage às exigências; o modo como harmoniza suas ideias e emoções, ou ainda, o acesso às potencialidades. Alcançar tal condição exige uma atitude de abertura para o auto cuidado, reflexão e escuta de si mesmo. Muitas vezes é um processo de desconstrução em que colocamos em exame nossas convicções, hábitos e percepções.

A experiência da vida não pode ser vista num sentido utilitário, esse é um padrão que tem regido o nosso tempo, é uma ideia embutida na modernidade e que tem levado o ser humano à exaustão e ao esvaziamento de sentidos. Não viemos a vida para produzir, mas para fruir a dela.

[1] Han, Byung-Chul. Sociedade do cansaço. Petrópolis, RJ: Vozes, 2017.