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CRISE

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O futuro é uma medida do tempo que estamos sempre tentando adivinhar. Por um lado, pensar no amanhã nos convida a planejar a vida, redimensionando-a na melhor das hipóteses a partir da realidade, sempre motivados por nossos desejos. Por outro lado, a tentativa de garantir o porvir pode nos lançar a um estado de angústia permanente. Nosso desejo de soberania sobre o futuro em nada facilita a conciliação que precisamos fazer diariamente entre o que desejamos e o que podemos exigir da vida e dos relacionamentos que firmamos no transcorrer dela.
O ser humano deposita sua sensação de segurança em baluartes aos quais se condiciona de maneira a não contestá-las. Quando essas estruturas se vêem ameaçadas, surgem, num primeiro momento, medidas ilusórias que tentam aplacar o sentimento de desamparo. Nada mais do que frágeis reações defensivas e, por vezes, desesperadas frente ao tatear das adversidades diárias. Minimizar fatos ou distorcer a realidade denota atitudes de risco ou, no mínimo, com poucas chances de que a experiência assuma um caráter transformador.
O termo crise pode ser compreendido no seu sentido plural. É um conceito considerado por muitas áreas do conhecimento. Falamos de crise existencial, crise econômica, crise política, crise de relacionamento, crise da saúde, física ou psicológica, entre tantas outras. Porém, em todos os sentidos crise representa transformação. A Psicologia identifica crises inerentes e, de certa forma, inevitáveis, ao logo do desenvolvimento do ser humano. Elas implicam situações de mudanças que provocam rupturas na homeostase a nível biológico, psicológico ou social, exigindo do indivíduo ou do grupo, um esforço para manutenção do equilíbrio físico e emocional. Perde-se, portanto, aqueles elementos estabilizadores que tínhamos como certos.
O próprio sentido etimológico da palavra nos fornece as pistas quanto à relevância da experiência. Do latim crisis, refere-se a mudanças repentinas e necessidade de decisões. Do grego, a etimologia aponta que krísis é um momento ou período difícil de ser superado que exige capacidade para distinguir, separar, decidir e julgar, antes de agir.
Embora toda experiência de crise eleve o grau de vulnerabilidade dos elementos nela envolvidos, a evolução pode ser tanto maléfica quanto benéfica, uma vez que, o ponto de chegada ao fim dessa depende fundamentalmente de como o indivíduo ou grupo serão capazes de lidar com perdas, substituições, renúncias, readaptações, juízos e decisões. É determinante a forma como os componentes da crise são vividos, se de maneira mais dissociada, negada, projetada ou sublimada.
Por exemplo, estamos em meio a uma crise de muitas dimensões. A população mundial se encontra assolada por uma pandemia de proporções inimagináveis. Seus efeitos podem ser sentidos na saúde, nas instituições e na economia. As pessoas estão vendo suas vidas serem transformadas desde suas bases, sejam elas, laboral, social ou familiar, até nos detalhes de seu dia-a-dia.
Sendo assim, é preciso considerar que uma experiência de crise tem mais chances de evoluir negativamente na medida em que os recursos pessoais se tornam restritos ou insuficientes, ou ainda, quando o nível de estresse vivenciado ultrapassa a capacidade de adaptação e de reação do indivíduo.
A situação que o mundo enfrenta, ameaça nosso valor supremo – a vida, sem ela não há força de trabalho, não há Estado, não há instituições, não há sociedade, isso já é motivo suficiente para que nossas defesas sejam acionadas. O risco de perdermos pessoas que nos são caras, vermos nossos recursos financeiros diminuírem; nossa liberdade cerceada ou mesmo adaptações compulsórias, são desencadeadores inegáveis de crise.
Contudo, há que se considerar que crise também pode ser vista, como uma possibilidade de crescimento, pois quando a evolução é favorável o que se conquista é a ampliação da capacidade adaptativa, a criação de novos equilíbrios e o reforço da capacidade de reação frente a situações complicadas.
O período que vivemos tem nos cobrado reflexão, avaliação crítica das circunstâncias, planejamento, tomada de decisões e ações. Nesse sentido, passar por uma pandemia pode, na melhor das hipóteses, colocar em análise nossas prioridades e nossos valores, pois, diante de toda crise as pessoas se vêem exigidas a mobilizar seus recursos psíquicos, oportunizando o exercício e reconhecimento do seu potencial, proporcionando o desenvolvimento de autonomia, criatividade e reposicionamento subjetivo.